Um dos períodos de maior terror e crueldade em toda a história do Brasil foi o da repressão implantada pela ditadura que sobreveio ao golpe militar de março de 1964, que destituiu um presidente eleito e praticou prisões ilegais, torturas, assassinatos, perseguições, censura, proibições, extinguiu as liberdades políticas e fechou o Congresso Nacional por várias vezes. A ação do estado autoritário que assaltou o poder, deixou marcas profundas em toda uma geração que carrega em sua memória, as lembranças do horror e da tensão dos “anos de chumbo”, mas também o orgulho de ter impetrado uma resistência firme, trazendo a tona para a sociedade brasileira, toda a podridão abrigada no interior do regime militar.No início da década de 60, o Brasil vivia um processo político muito intenso, com as mais diversas forças sociais atuando no cenário nacional, onde os movimentos populares se expressavam de forma aberta e dava, passos na sua livre organização.
Estudantes, trabalhadores, artistas e intelectuais se empenhavam na democratização da educação e da cultura.O Presidente João Goulart, aproxima-se destes setores mais à esquerda com medidas nacionalistas como a Lei de Remessa de Lucro e discute-se amplamente a reforma agrária, tendo como referência importante as Ligas Camponesas, organizadas por Francisco Julião. Setores conservadores, aliados ao capital estrangeiro, inflam o velho fantasma do "perigo comunista" e precipitam um golpe que depõe Jango, implantam uma ditadura militar, que logo nas primeiras semanas, demite 10 mil funcionários públicos, prende 40 mil pessoas, destrói 25 mil livros de autores diferentes e cassa os direitos políticos de 2.700 cidadãos, dando início a um terrível período de cerceamento de direitos e desrespeito à condição humana
Para se consolidar no poder, a ditadura busca neutralizar o movimento de oposição, e extingue 13 partidos políticos, cancela as eleições presidenciais previstas para 1966, cria a Lei de Imprensa e a Lei de Segurança Nacional, intervém na estrutura sindical e joga a CGT na ilegalidade, além de continuar cassando, prendendo e exilando inúmeras lideranças populares. Mesmo estabelecendo um permanente estado de sítio, com o AI-5 institucionalizando o terror e centros de tortura e morte espalhados pelo país, a ditadura não consegue neutralizar a resistência que de imediato manifesta sua insatisfação promovendo passeatas, greves e manifestações as mais variadas, com os estudantes dirigidos pela UNE, assumindo a vanguarda do protesto. No Calabouço, morria Edson Luiz e nas ruas a célebre passeata dos 100 mil protestava:
“Vem vamos embora que esperar não é saber
quem sabe faz a hora não espera acontecer”
(Geraldo Vandré)
A esquerda aprofundava o debate interno sobre táticas e estratégias políticas, e com isso novas ramificações surgiam da matriz do Partido Comunista (MR-8, POL0P, COLINA, VPR, VAR-PALMARES, POC, ALN, PCBR, AP, etc.). Contra a ditadura qualquer maneira de luta vale a pena. As ações armadas surgem e se ampliam: invasões e tomadas de rádios para divulgação de manifestos, seqüestros de diplomatas para serem trocados por presos políticos e assaltos a bancos para financiamento da luta revolucionária.
Na virada da década, o país do “ame-o ou deixe-o”, cantava “prá frente Brasil, salve a seleção”. Era o tempo da Transamazônica, milagre econômico, 200 milhas, e ......... cartazes espalhavam em todos os cantos o rosto de centenas de jovens idealistas sob o rotulo de terroristas, e haja assassinatos: Marighella, Mário Alves, Joaquim Câmara, Lamarca, Stuart Angel, Honestino Guimarães, José Porfírio, Paulo Wright, Pedro Pomar, e muitos outros.
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia ........
Chico Buarque)
Mais uma vez os estudantes nas ruas, pelas Liberdades Democráticas e Anistia Ampla Geral e Irrestrita, e junto com as donas de casa e os trabalhadores contra a carestia, greves econômicas, passeatas, etc. Novamente o movimento popular se organizava contra a Ditadura. O MDB ganha as eleições para governador em 1974, instituições como CNBB, ABI, OAB, UNE, sindicatos e setores progressistas da Igreja manifestavam-se seguidamente “contra a fome e a farsa”. Denúncias de prisões arbitrárias, torturas e mortes, como a do jornalista Vladimir Herzog, e o operário Manoel Fiel Filho, eram cada vez mais contundentes, o que desestabilizava o governo militar. A luta pela anistia ganha corpo, mas a promessa de abertura "lenta e gradual" não extinguiu a violência. A extrema-direita tenta se articular e lança ofensiva com ameaças e atentados a bombas contra jornais de oposição, personalidades e entidades democráticas. Mas .... o “outro dia” já vinha raiando, fechando 20 anos (1964/84) de Ditadura Militar no Brasil, nos quais 500 mil pessoas foram processadas, indiciadas, ou presas por motivos políticos.
Até hoje restam fatos a esclarecer, paradeiros a desvendar, mortos a enterrar. Uma mancha forte de sangue brasileiro ainda é viva, apesar das tentativas de se instalar um pacto velado de silêncio e de não apurar-se tais incógnitas. A resistência impetrada pelo povo brasileiro nos "anos de chumbo" contra a intolerância, o desrespeito e a violência desumanas impostos por um governo tirano demonstravam mais uma vez que, onde quer que se levante contra ele a opressão, ele não se renderá, pelo contrário, responderá com luta, da forma que for possível e necessária para derrubar tudo aquilo que lhe ousar oprimir.
Não é sobre liberdade (e eles sabem disso)
Há 5 semanas
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